'Temos de mudar o modelo de gestão, senão vamos consolidar o fracasso'

Papo sobre Política

Criado em 16 de Dezembro de 2015 Papo sobre Política

Fotos: Augusto Martins

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Julia Ruiz

NASCIDO E CRIADO EM BETIM, o empresário do ramo de comunicação visual e atual secretário municipal de Desenvolvimento Econômico, Fabrício Freire, 45 anos, tem um projeto audacioso para 2016: candidatar-se a prefeito desta cidade. Ele, que sempre acompanhou de perto a política local, usa o tempo à frente de uma das principais pastas da administração pública para aprender tudo sobre o funcionamento da máquina. Entre vícios e virtudes, capacidades e morosidades, Freire se diz feliz pela experiência e apto a alçar novos voos, mas também frustrado com alguns caminhos percorridos pela atual administração, da qual se desligará, no início do próximo ano, para se dedicar integralmente ao projeto pessoal. Em entrevista à Mais, o pré-candidato “abriu o jogo” sobre seus objetivos, atacou planos de governos e falou do que a prefeitura e a cidade precisam.
 
Fabrício Freire não tem medo da crise política e da recessão econômica que assustam boa parte dos brasileiros. Acostumado a atuar na iniciativa privada, na qual se firmou como empresário desde 1986, ele acredita que é justamente em momentos como este que surgem grandes oportunidades de mudança e de rompimentos necessários. “Crise é oportunidade, é aprendizado. Você sai da zona de conforto e vai buscar soluções. Existem diversas boas ideias e bons caminhos a serem percorridos. Basta saber ouvir, dividir, formar parcerias inteligentes e ser criativo”, diz, emendando que, nestes períodos, “é preciso pensar a curto, a médio e a longo prazos. A curto, temos que ser mão de ferro, pois é um momento emergencial. Cada pequeno gasto deve ser controlado. A médio, é necessário preparar a casa e fazer por onde o futuro ser melhor. E, a longo prazo, não se pode perder o foco de que a cidade é movida pelas indústrias automotiva e petroquímica, mas que é nosso dever pensar em matrizes alternativas para diversificar a economia e, consequentemente, termos mais autossuficiência. Betim ainda está no lucro. É claro que, diante de um cenário como esse, o primeiro corte para reduzir custos vem no emprego. Mas não perdemos nenhuma indústria. Elas podem ter cortado postos de trabalho, reduzido turnos, enxugado a produção, mas todas ainda estão em atividade. E isso é bom porque, quando a economia retomar o fôlego, os empregos e os faturamentos vão voltar”.
 
Acostumado a acompanhar as movimentações políticas e as gestões municipais desde que abriu o próprio negócio, Freire percebeu que o envolvimento mais intenso com esse mundo seria inevitável. “Como sempre trabalhei com comunicação visual, a cada dois anos eu prestava serviços para as campanhas de candidatos a prefeito e a vereador de Betim. Isso me fez ficar bem imerso na política. Também já fui fornecedor do poder público, tanto do Legislativo como do Executivo. Então, chega-se a um ponto em que você participa tanto que, sem perceber, já começa a entrar no processo. Você enxerga problemas, questiona posturas e adota uma visão mais crítica, identifica-se com pessoas que, em determinado momento, têm o mesmo pensamento e o mesmo intuito que você, e, aí, tudo se forma. Como sou do comércio, sempre estive nessa área de desenvolvimento econômico, e foi muito bom ir para ‘o outro lado do balcão’. Isso me fez aprender muito, conhecer todo o processo administrativo e reunir condições para entender bem o funcionamento de todas as áreas”.
 
Apesar das dificuldades, valeu a pena, segundo ele. “Tenho tido um crescimento profissional e pessoal enorme, mas, por outro lado, fico frustrado porque, em algumas áreas, não conseguimos avançar e transformar o potencial que a cidade tem em qualidade de vida para a população. Isso, juntamente com a morosidade com a qual as coisas acontecem, me deixa frustrado. Eu sou muito ansioso, cobro demais prazos e metas para resolver as coisas. Acho que a gestão tem de desburocratizar os serviços e integrar mais as secretarias”.
 
Outro aspecto que colaborou muito para o empresário decidir disputar a próxima corrida eleitoral é o clamor da população por mudanças. Mais experiente, ele entende que pode contribuir com um novo modelo de administração, em que vícios devem ser rompidos em nome do avanço. “A população clama por mudança. Betim avançou em alguns pontos importantes nos últimos anos. Mas, hoje, o que temos de fazer é, sem qualquer vaidade, pegar o que está sendo produtivo, continuar e melhorar. Já a forma de gerir a cidade precisa ser mudada. Não dá para governar Betim nos próximos quatro anos da maneira como ela foi governada até agora, senão vamos consolidar o fracasso. Por exemplo, o modelo de limpeza urbana que temos hoje está defasado. Limpeza não está ligada apenas ao meio ambiente, mas também à saúde, à educação e à segurança. Ou seja, pede uma ação conjunta. Temos de rever também nosso sistema de informática dentro da prefeitura. Os serviços precisam estar informatizados. É inadmissível a prefeitura não estar 100% integrada com o cidadão. Isso geraria uma série de benefícios, como agilidade nos processos e economia de certos gastos. Outras coisas que precisamos rever são a Lei Orgânica do município, o Plano Diretor, e o Código de Posturas. Tudo isso em ampla e rápida discussão com a sociedade. É apresentar, debater, concluir e aplicar”, crava o pré-candidato.
 
NOVOS ARES
Para traçar melhor seus projetos e ideias, Fabrício diz que deixará o governo no começo de 2016. Ele justifica que quer aproveitar o período para percorrer todas as regiões da cidade e conversar com os moradores. Sem se preocupar ainda com os arranjos políticos e com as possíveis alianças – de mudança ou de continuidade –, ele garante que o intuito é fazer com que a população o conheça melhor. “Não estou saindo pré-candidato com o apoio de A ou B. Interessa a mim o apoio da população. Alianças partidárias, tudo isso ocorrerá numa etapa posterior. Defini que vou deixar o governo já no início do próximo ano justamente para me dedicar integralmente a esse projeto pessoal. Não seria correto permanecer na secretaria e, ao mesmo tempo, fazer tudo isso. Mas, enquanto estiver na gestão, vou trabalhar por ela, dando o meu melhor”.
 
PARA A CIDADE, NÃO PARA O GOVERNO
Questionado sobre os principais pontos daquele que seria o seu plano de governo, Freire é enfático ao afirmar que os projetos de governo representam algo já falido. “São ações pontuais para resolver anseios da população. Mas não existem só problemas pontuais. O governo precisa pensar a cidade nos 50 anos seguintes, não apenas nos próximos quatro. Deve-se partir do macro para o micro. Prometer que se vai reformar uma praça, cobrir uma quadra ou ampliar um serviço, por exemplo, é inerente à atividade do gestor. O que se precisa fazer é apresentar um modelo de gestão que vai mudar a vida da população de uma forma positiva e crescente. Assim, consequentemente, os problemas pontuais serão resolvidos”, argumenta o empresário.
 
Ele ressalta que Betim possui um projeto de governo já pronto, que deve ser levado em conta pelos candidatos e que muda todo o processo eleitoral. “Betim tem a Lei de Metas, e isso, para o cidadão, é um ganho porque se trata de um protocolo de intenções que o gestor assina para que a cidade não paralise a cada quatro anos. Isso, que já está consolidado, deve nortear as ações de um governo. Até porque essas metas são baseadas em indicadores, como o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), e nas demandas reais da população. Então, a próxima administração precisa cumprir a Lei de Metas e adequar a gestão de forma a cumprir as prioridades elencadas”.
 
 
AUTOAVALIAÇÃO
Quando avalia o trabalho à frente do Desenvolvimento Econômico, Freire acredita que tem boa atuação, mas reconhece que poderia ter feito mais se as diretrizes da atual administração tivessem sido diferentes. “Se houvesse uma gestão integrada, sem dúvida, teria mais e melhores condições para trabalhar. Mas, mesmo com a demora nos processos, conseguimos avançar em pontos importantes. Por exemplo, melhoramos o relacionamento com os empreendedores da cidade e conquistamos um respeito grande por parte das grandes empresas. Conseguimos organizar a questão dos alvarás, ainda em 2013, e zerar os processos que estavam parados. Implantamos o alvará eletrônico, um ganho enorme. Há casos em que concedemos o alvará no mesmo dia, dependendo do porte ou do segmento da empresa. Nesse aspecto, hoje somos referência no Estado e no Brasil perante as juntas comerciais, que nos visitam frequentemente. A qualidade do trabalho dentro da secretaria também melhorou muito. Antes, só ‘apagávamos incêndio’; hoje, temos iniciativas. Por exemplo, estamos fazendo o recadastramento de todas as empresas de Betim. Vamos ter todas devidamente georreferenciadas, mapeadas pelo que, quanto e onde produzem, por faturamento e pela quantidade de funcionários. Só estamos adequando a plataforma de dados, que, infelizmente, é deficiente, mas vamos permitir as consultas já no primeiro semestre de 2016”, informa.
 
Questionado sobre o que seria, então, uma boa gestão, o empresário ressalta a figura do servidor público, que, para ele, é a principal peça da engrenagem do setor público; a transparência nos compromissos do governo; e a agilidade na prestação de serviços. De acordo com Freire, algo que trava o avanço de Betim são os embates políticos. “A cidade precisa de uma gestão diferenciada, moderna, que rompa com antigos paradigmas e deixe as divergências políticas somente para a campanha eleitoral. Definiu-se a eleição, então é hora de esquecer a vaidade e de agregar pessoas que possam efetivamente contribuir com o governo. Por que o candidato eleito não pode absorver ideias ou pessoas de seu adversário? Se isso for construir uma gestão melhor, por que não? Podem dizer que isso é uma utopia, mas acho que em Betim falta esse amadurecimento político. A oposição é algo saudável, pois ela te alerta para muitas coisas e fiscaliza suas ações; o que ela não pode ser é destrutiva. O que a cidade precisa é agregar pessoas que querem o avanço, que buscam eficiência na gestão e qualidade de vida para todos”.
 
INICIATIVA PRIVADA É EXEMPLO
Levar ao poder público características da iniciativa privada é uma necessidade urgente apontada por unanimidade pelos entrevistados do Papo sobre Política. Para Freire, não é diferente. “O poder público é um prestador de serviços. Por exemplo, as nossas escolas devem ter uma postura de escola particular, que, normalmente, tem um compromisso maior com a excelência. Não é só porque não há cobrança de mensalidade que tem de ser diferente. Nosso setor de saúde deve funcionar como os bons hospitais particulares. O de obras precisa operar como uma construtora. É necessário nortear as ações por indicadores de qualidade, estabelecendo-se metas e prazos. E se há, na iniciativa privada, um reconhecimento ao mérito, à capacidade dos colaboradores, precisamos levar isso também ao poder público. O bom funcionário não pode ser tratado da mesma maneira que o improdutivo. Aliás, os cargos devem ser ocupados levando-se em conta a capacidade técnica e a competência, pois isso motiva os trabalhadores. É necessário criar mecanismos de avaliação e de reconhecimento dos bons profissionais. Precisamos oferecer melhores condições de trabalho ao servidor para que ele se sinta bem e se comprometa com o serviço. Ele precisa bater no peito, com orgulho, e dizer: ‘eu trabalho na Prefeitura de Betim’”.
 
CONTRASTES
Apesar de representar a segunda economia de Minas Gerais, Betim não mostra, em suas ruas, um equilíbrio de renda entre a população, constituindo-se esse ponto em um grande desafio para os próximos gestores. Para Freire, capacitar a mão de obra local é o ponto-chave da questão. “Isso fará com que a média salarial do betinense aumente e também que não seja necessário trazer profissionais de fora. É preciso descobrir os pontos deficientes para investir na qualificação de trabalhadores e suprir as demandas. Oferecendo essa mão de obra, consequentemente vamos melhorar essa distribuição”.
 
Outro aspecto que tem a atenção de Freire é o fato de Betim não aparentar ter a receita grandiosa que possui. “O betinense possu um amor e um orgulho gigantesco pela cidade, mesmo que tudo esteja um caos. O gosto que o povo tem por Betim merece retorno. Precisamos ‘fazer uma plástica’ na cidade, deixá-la bonita, agradável, com boa infraestrutura para justamente fazer jus a esse sentimento do betinense. É válido se inspirar em projetos que deram certo e trazer isso para cá”.
 
PREPARO
Para Fabrício Freire, a vivência de 29 anos como empresário e a experiência na atual gestão deixam-no preparado para assumir o desafio de administrar o município. “Nossa cidade tem todas as possibilidades de ser uma das melhores do país. Devemos unir pessoas com boas ideias e vontade de fazer acontecer para transformarmos Betim no lugar ideal. Sabemos o que fazer e como fazer. E esse período que o país atravessa é o momento certo para definirmos o que realmente queremos. Os problemas são muitos, mas para cada um deles há dezenas de soluções. É só agregar as pessoas certas, sem interesses pessoais, sem rancor e vaidade, para inaugurarmos uma nova era. Condição e potencial nós temos. O governo deve ser o propulsor, dar o start. Assim, automaticamente, a população se torna parceira, abraça o projeto, e os avanços ocorrem”.

 




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