A verdadeira mudança haverá de ser do eleitor

Criado em 29 de Agosto de 2016 Conversa Refinada
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Adalberto José Rodrigues Filho

Idade: 45 anos

Família: casado e pai de duas filhas

Naturalidade: Santo Antônio do Monte (MG)

Formação: bacharel em direito (PUC-MG) e pós-graduado em direito público (PUC-MG) e em direito da comunicação (Universidade de Coimbra, em Portugal, pela Escola Nacional da Magistratura) 

 

 

Nascido na cidade mineira de Santo Antônio do Monte, o juiz Adalberto Rodrigues, 45 anos, que atua na Comarca de Betim desde 2001, acumula, atualmente, as funções de juiz eleitoral da 40ª Zona Eleitoral de Betim e de titular da 1ª Vara Cível da Comarca do município. Como juiz eleitoral, Adalberto esclarece, nesta conversa com a reportagem, os principais pontos de mudança proporcionados pela minirreforma eleitoral, instituída pela Lei 13.165, de 2015. As novas regras impostas pela legislação já valem para as eleições de outubro. Doutor Adalberto as analisa como “adequadas ao momento político e econômico do país”, acreditando que elas serão úteis. Todavia, para ele, “a verdadeira mudança haverá de ser do próprio eleitor, de seus propósitos e perspectivas frente a todo o processo”. “O eleitor deve escolher seus candidatos buscando se proteger da manipulação, da maquiagem e do deslumbramento da propaganda”, completa.

Há quanto tempo atua como juiz? E desde quando está em Betim? 

Fui aprovado no concurso da magistratura estadual de Minas Gerais em 2000. Após a posse, em novembro de 2000, fiz o curso de formação inicial de juízes de direito por seis meses. De maio de 2001 até 2006, exerci o cargo de juiz de direito substituto designado para o Juizado Especial da Comarca de Betim. Ainda em 2006, fui promovido a juiz titular da 2ª Vara Cível e Criminal da Comarca de Pitangui/MG, onde exerci a função de juiz eleitoral nas eleições de 2008. Entre setembro de 2009 e julho de 2010, estive licenciado para realizar o curso de direito da comunicação, em Coimbra, Portugal. Antes de retornar de lá, em fevereiro de 2010, fui promovido e assumi o cargo de 1º juiz de direito auxiliar da Comarca de Betim, em que atuei até assumir a titularidade da 1ª Vara Cível da Comarca de Betim, em setembro de 2011, cargo que exerço até a presente data. Em janeiro de 2015, assumi, paralelamente, a função de juiz eleitoral da 40ª Zona Eleitoral de Betim, pela qual vou trabalhar nas eleições de outubro de 2016.


Antes de se tornar juiz, exerceu a advocacia ou trabalhou em outro segmento? Conte-nos sua trajetória profissional.

 Antes de me formar em direito, fui office boy, operador de computador, auxiliar de escritório, além de ter feito estágio, já no período de faculdade, no departamento jurídico da liquidação extrajudicial da Minas Caixa, onde me aproximei muito do direito administrativo.

Formado, trabalhei como advogado no processo de liquidação extrajudicial da Minas Caixa entre 1994 e 1996. Em seguida, abri escritório de advocacia, que foi credenciado para representar a Caixa Econômica Federal.

No ano de 1997, fui aprovado em concurso público e assumi o cargo de defensor público estadual, quando atuei perante o Juízo da 5ª Vara Criminal da Comarca de Belo Horizonte, período em que pude me aproximar da prática da Justiça criminal, alargando minha experiência na ciência do direito. Assim, trabalhei até minha posse no cargo de juiz de direito.

Minha atuação como juiz tem muita identificação com Betim. Trabalhei no Juizado Especial da Comarca entre 2001 e 2006, período em que criei vínculo com o município, fazendo amigos. Betim passou a ser minha cidade de referência. Após uma passagem também muito gratificante na Comarca de Pitangui, voltei para cá, já como juiz titular, em 2010, e aqui mantenho  residência.

Essa não é uma trajetória comum entre os juízes de direito, que costumam iniciar a carreira em cidades mais distantes da capital. Em razão de características especiais do período em que entrei na magistratura – era a fase de expansão dos Juizados Especiais no Estado –, pude vir direto e ficar em uma Comarca como Betim, de entrância especial, durante longo tempo, mesmo que como juiz substituto. Assim, minha identificação com o município é muito grande, pois, dos meus quase 17 anos na carreira, 12 foram aqui.

Sobre a minirreforma eleitoral ocorrida no ano passado, para o senhor, quais são os principais pontos de mudança? Explique-os, por gentileza.

Na própria exposição de motivos, a Lei nº 13.165/2015, que traz a minirreforma eleitoral, esclarece que seu objetivo é reduzir os custos das campanhas eleitorais. A norma prevê diminuição de gastos ao patamar máximo de 70% do valor despendido no pleito anterior, além de redução do prazo de campanha. Antes, esta se iniciava na segunda quinzena de julho, e, agora, tem início no mesmo período de agosto. Tudo com o objetivo de diminuir o orçamento. São relevantes ainda a proibição de doações para campanhas originadas de pessoas jurídicas e a proibição do uso de cavaletes em vias públicas, o que poluía visualmente as ruas.

O juiz Adalberto Rodrigues acompanhado de toda a equipe da secretaria da 1ª Vara Cível da Comarca de Betim

Qual o principal objetivo buscado com essas alterações na legislação?

Como se vê, as mudanças atingiram basicamente o financiamento das campanhas. O objetivo foi racionalizar os crescentes gastos com a propaganda eleitoral, não somente para viabilizar uma redução do custo, mas para tornar o pleito menos vinculado à propaganda e mais voltado às propostas dos candidatos.

O senhor acredita que esse propósito será alcançado ou que essas eleições serão um experimento da nova lei, conforme alguns cientistas políticos têm afirmado?

Qualquer lei precisa de um prazo para se solidificar a partir da jurisprudência. Porém, na perspectiva do direito, não vislumbro que tenha ocorrido uma mudança tão significativa a ponto de se dizer que teremos um experimento. As bases do sistema eleitoral foram mantidas, e leis visando à redução de custos de campanha não são novidade. Na última década, essa tem sido uma tendência nas eleições. E entendo que as restrições têm funcionado.

Nas eleições anteriores, já estavam proibidos espetáculos de artistas em comícios, fator que realmente reduz investimentos de campanha. Também já estava vedado o uso de outdoors. Nesses exemplos, podemos notar que o propósito foi retirar da propaganda eleitoral instrumentos que objetivavam apenas a fixação do nome dos candidatos, sem a efetiva exposição de suas ideias e de seus objetivos.

Portanto, acredito que esse processo de mudanças tem sido útil e vem funcionando satisfatoriamente para o fim de baixar os orçamentos de campanha.

Como o senhor avalia a proibição de custeio das campanhas por parte de empresas?

Positivamente. O financiamento de campanhas é um problema em qualquer democracia. Até mesmo nos EUA – exemplo premente de democracia –, podemos identificar graves questões a esse respeito. A restrição para a compra de arma de fogo é um dos objetivos que Barack Obama não atingirá em seu mandato, pois, inobstante a ocorrência de uma série de fatos envolvendo porte de armas de guerra entre os cidadãos comuns, o Congresso americano não vota leis sobre o assunto da restrição, fato que é creditado ao financiamento das campanhas eleitorais pela indústria de armas naquele país.

Portanto, a restrição de financiamento por empresas pode, mesmo que brandamente, diminuir a dependência do candidato com a fonte de verbas para a promoção da candidatura. Afinal de contas, quando eleito, ele haverá de ter o eleitor como aquele que promoveu sua vitória.

A publicidade dos candidatos também recebeu restrições com as alterações na legislação. Para o senhor, quais serão as principais consequências dessas mudanças?

Acredito que o fator preponderante será a diminuição da influência da propaganda nas campanhas, de forma que as ideias, as propostas e os perfis dos candidatos possam preponderar no curso do processo, ou, pelo menos, sair de um plano inferior de importância.

E, com orçamentos limitados, pode haver redução da distância entre os mais bem-financiados e os que já possuíam severas restrições orçamentárias. É um bom caminho a ser trilhado, acredito.

Um ponto que nos chama atenção neste período pré-eleitoral é a grande quantidade de coligações entre partidos. O senhor vê nisso uma tendência de redução do número de legendas, com a possibilidade de se instaurarem disputas polarizadas no país no futuro?

Infelizmente, não vislumbro qualquer tendência de redução do número de legendas. Temos, aproximadamente, 30 partidos políticos no Brasil ainda em processo de formação. Ou seja, ainda não foram criados legalmente, mas estão a caminho. E já temos outros 30 em plena atividade. É um descomunal excesso.

Daí que nascem as coligações. Sem grandes recursos e, principalmente, sem nomes de peso para vencerem o pleito isoladamente, pequenos partidos se unem entre si e aos grandes. É um mecanismo de sobrevivência.

A polarização, por sua vez, não é benéfica. Porém, cinco tendências políticas já seriam suficientes para uma exuberante democracia. Trinta ou 60 partidos, cada qual prometendo  ter uma ideologia própria, não fazem qualquer sentido.

Para finalizar, o senhor acredita que essas novas regras representam uma evolução no processo eleitoral?

Entendo que as novas regras são adequadas ao momento político e econômico do país. E serão úteis. Vão funcionar até determinado limite. Mas se referem à propaganda. Não reconheço esse como um problema direto do eleitor. É uma questão a ser digerida apenas pelos partidos. Não terá tanta influência no processo eleitoral. E a propaganda sempre existirá, e é bom que exista. Não é um problema em si mesma. Possui enormes vantagens.

Mas a verdadeira mudança haverá de ser do próprio eleitor, de seus propósitos e perspectivas frente a todo o processo. O eleitor deve escolher seus candidatos buscando se proteger da manipulação, da maquiagem e do deslumbramento da propaganda. Deve estar atento, por outro lado, aos que sustentam o orçamento da campanha de seu candidato, para não dar seu voto a quem é financiado para defender outros interesses.A democracia somente existirá em sua plenitude quando o financiamento de campanha não influir no voto. É utopia minha? Ou nossa? Com certeza. Mas é para isso que existem as utopias. 

 




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