Atividade Paranormal

Capa | Fenômenos Sobrenaturais

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Criado em 15 de Julho de 2015 Capa

Fotos: Augusto Martins

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Que atire a primeira pedra quem nunca se impressionou com alguma história relacionada aos seres “do lado de lá” ou, em bom português, com uma assombração. De acordo com o Dicionário Online da Língua Portuguesa, assombração significa “objeto fantástico ou fantasma que assombra, que causa terror; alma do outro mundo, aparição; susto causado pelo encontro ou surgimento de coisas sobrenaturais; terror procedente de causa inexplicável”. Já se arrepiou? Então, conheça a história de um grupo que deixou o medo de lado para capturar algumas das criaturas mais temidas pelos moradores da região das históricas cidades de Mariana e Ouro Preto, na região Central de Minas
 
Daniele Marzano e Julia Ruiz
 
SEJA IMPRESSIONÁVEL OU CÉTICO, seja religioso ou ateu, o ser humano sempre esteve, de alguma forma, fascinado pelo sobrenatural. Uns são curiosos e quase viciados no consumo de fotos, vídeos e contos macabros; outros têm verdadeiro pavor só de imaginar uma aparição de origem desconhecida; e há aqueles que possuem medo, mas não resistem às histórias assustadoras, ainda que passem noites em claro depois. Se, por um lado, a indústria do cinema, por exemplo, fatura milhões em bilheteria explorando esse fascínio – segundo o portal norte-americano The Numbers (especializado em estatísticas sobre a sétima arte), o terror é o terceiro dos dez gêneros que mais faturam, perdendo apenas para aventura e ação, respectivamente –, por outro, deparar-se com uma assombração fora da ficção pode ser bem mais traumático do que se imagina.
 
No entanto, para a sorte de quem já passou por essa experiência, principalmente nos arredores das históricas Mariana e Ouro Preto, na região Central de Minas Gerais, existe um destemido grupo de pesquisadores a postos para esclarecer aparições e auxiliar quem já esteve frente a frente com esses seres assombrosos. Criada em 2009, a Associação de Caçadores de Assombração de Mariana (Acam) coleciona uma série de histórias literalmente surreais, com o trunfo de desvendar intrigantes mistérios e, consequentemente, aliviar os atormentados.
 

Diretor do jornal “O Espeto”, também de Mariana, o coordenador de pesquisa histórica e um dos fundadores da Acam, Leandro Henrique dos Santos, conta que o periódico o motivou a pesquisar fatos considerados mitos, lendas e folclore. “Desde 1998, venho publicando no jornal casos com depoimentos detalhados sobre seres que ninguém soube definir o que eram. Foram diversos relatos de assombrações, em que as pessoas não só testemunharam os fatos, como também revelaram sua identidade e mostraram o rosto, desafiando o senso comum e convidando todos a abrirem os olhos para outra realidade”.

A repercussão das narrativas acabou colocando Santos diante do primeiro de diversos intrigantes mistérios que ele buscaria desvendar: nada menos do que uma das criaturas mais conhecidas e temidas do folclore brasileiro. “Em 2008, o popularmente conhecido Caboclo D’água aterrorizava a Zona da Mata e, apesar de inúmeras narrações de ataques a animais na cidade de Mariana e em municípios vizinhos, como Barra Longa, Acaiaca e Diogo de Vasconcelos, nenhuma autoridade investigava os casos. Comecei, então, por meio do jornal, a registrar esses testemunhos. Em 2009, esse ser atacou várias pessoas. Em 2010, em nova agressão, um grupo de amigos foi surpreendido quando nadava na região, culminando na morte de um rapaz. Na ocasião, o Corpo de Bombeiros de Ouro Preto atestou que ele havia morrido em decorrência de uma mordida nos testículos por um animal misterioso. Cansados de esperar uma ação do poder público, eu e algumas pessoas que realmente se interessaram por esses casos começamos a organizar atividades para provar que esse ‘animal’, descrito como parte macaco, parte galinha e parte lagartixa, existe”.
 
Assim, despretensiosamente, a Associação de Caçadores de Assombração de Mariana dava seus primeiros passos. “Quando vimos, já estávamos com uma equipe de estudiosos e especialistas em diversas áreas discutindo as inúmeras aparições que chegavam ao nosso conhecimento. Sem querer, havíamos formado uma equipe para analisar fatos sobrenaturais, com suporte e acesso a equipamentos e recursos formidáveis para executar nossas pesquisas”, diz Leandro.
 
E o trabalho do grupo não foi apoiado apenas em crenças populares. O professor da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) Milton Brigoline, fundador da Acam, iniciou as atividades aplicando metodologia científica para estudo de caso e registrando narrativas de pessoas de diferentes locais. “Fomos pesquisando e, à medida que avançávamos, percebíamos a importância de estarmos física e psicologicamente preparados para desvendar os relatos trazidos pela população. Afinal, imagine se você for surpreendido por uma assombração monstruosa: a quem irá recorrer? Quem vai entender e dar créditos ao seu depoimento? Era preciso pensar e agir de forma a compreender que outras realidades são possíveis”.
 
O lema da entidade? “Sapere aude” (ousai saber), responde, em latim, o coordenador de pesquisa histórica da Acam, explicando que os estudiosos se inspiraram no artigo “O que é esclarecimento?”, de Immanuel Kant, filósofo alemão. Para todos que compõem a associação, o essencial é trabalhar a curiosidade, buscando, constantemente, diferentes possibilidades além do senso comum. “Ao analisarmos casos, somos obrigados a estudar novas probabilidades. E a mente que se abre jamais será a mesma. Antes da Acam, nunca havia imaginado que há tanto para ver, admirar e conhecer. Nossa cultura faz com que o ser humano aprenda só o necessário para cumprir suas obrigações, e as religiões colocam uma barreira entre o sobrenatural e as pessoas. Ou seja, existem muitas questões ignoradas”, salienta Soares.
 
DO TEMOR À CAÇA
Um dos primeiros curiosos casos tratados pela Acam foi o das aparições em prédios antigos da Ufop. O surgimento constante de assombrações levou os vigias da universidade a pedirem demissão ou transferência para outros pontos, provocando alta rotatividade de funcionários e muita preocupação em todos que circulavam pelas instalações. “Foi feito, então, um estudo, coordenado pelo professor Milton Brigoline, e acabamos resgatando a normalidade nos prédios. Hoje, praticamente, não se fala sobre o assunto, e nenhum novo relato de assombração foi registrado. Deu tão certo que o chefe de vigilância da Ufop, Vicente Bispo, tornou-se membro da associação e, hoje, é nosso vice-presidente”, pontua Leandro sem conceder detalhes sobre os procedimentos utilizados. “A situação foi controlada”, completa Bispo.
 
MISTÉRIOS
De todas as histórias investigadas pela Acam, a do Caboclo D’água é a mais conhecida, tendo sido, inclusive, pauta para documentários de emissoras estrangeiras, como o canal Cuatro, de uma TV espanhola, que enviou para Mariana e imediações, em 2012, a equipe do programa “Cuarto Milenio”. Na ocasião, o jornalista Pablo Villarrubia afirmou ao blog “Arquivos do Insólito” que, em uma reportagem
feita anteriormente na Rússia, a equipe encontrou registros, de cerca de 2.000 anos atrás, que são muito semelhantes aos retratos-falados publicados no jornal “O Espeto”.
 
Conceituado por Leandro Soares como “animal perigoso”, o Caboclo D’água é conhecido por surgir às margens e dentro dos rios, e por aterrorizar pescadores, barqueiros e banhistas. De acordo com o portal InfoEscola, contos da população ribeirinha dizem que a criatura possui um temperamento forte e, quando nervosa, seu ruído pode ser ouvido a longas distâncias. Além disso, quando vai atacar os
pecadores, o ser agarra o fundo das canoas para que possam virar ou encalhar.
 
Notícia de destaque nos últimos anos em veículos de comunicação de maior alcance no país, o Caboclo D’água já teria sido visto por dezenas de pessoas na região de Mariana, na história mineira recente. Entretanto, se depender da Acam, todo o temor provocado pelo bicho vai ter fim. Para isso, os estudiosos vão precisar da ajuda de voluntários, que, além de muita coragem, terão que ter disposição.
“Em breve, realizaremos uma caçada ao animal, utilizando isca humana. Já temos três voluntários aprovados, mas precisamos de mais dois. Eles terão que deixar de tomar banho por uma semana para ficar com o odor atrativo para o monstro, além de permanecer 24 horas em uma gaiola na superfície do rio. Se o caboclo aparecer, esses voluntários ganharão R$ 1.000 de recompensa”.
 
DESAFIO AO CETICISMO
Alguns casos contados por Leandro representam um verdadeiro desafio a pessoas descrentes. Um deles é o da Noiva de Furquim, distrito de Mariana. “Sabemos que um acidente com um ônibus aconteceu próximo a esse distrito, em 1967. Onze pessoas morreram, entre elas uma noiva, enterrada sem sua aliança. Desde então, ela fica pedindo carona a quem passa pelo local, e o mais impressionante é que as pessoas param, ela entra no carro e, em seguida, desaparece, mas quem não para também a vê, pois ela surge de repente dentro do veículo. Certa vez, um ônibus de uma conhecida empresa fazia a linha BH-Ponte Nova, quando ela apareceu no ponto e o motorista parou. Logo depois, o trocador percorreu o veículo para cobrar as passagens e não a encontrou. Informados de que a ‘passageira’ havia sumido, alguns motoristas novatos chegaram a retornar, imaginando que ela havia pulado a janela, mas nada encontraram pelo caminho. O assunto gerou tanta repercussão que um enfermeiro da cidade vizinha Acaiaca, que duvidava da história, chegou a ir com os amigos à entrada de Furquim e desafiou a noiva dizendo que queria vê-la. O problema é que realmente ele a viu e, por isso, entrou em estado catatônico, tendo sido levado ao Hospital de Mariana, onde ficou internado. Depois de recuperado, nunca mais passou pelo local”, narra Soares.
 
“Há a história da Mãe do Ouro, que também chama atenção pela grande quantidade de depoimentos de pessoas que juram ter visto uma bola de fogo percorrer um trajeto enorme, em baixíssima altura, sem tocar a terra ou queimar o capim. De tanto olharem, alguns chegaram a queimar a retina”, conta o pesquisador. Outro integrante da Acam, Ezequiel Pereira, jura ter visto essa bola de fogo há alguns anos. “Trabalhávamos numa fábrica de tecidos e largávamos o serviço às 5h. Num determinado dia, resolvemos sair do trabalho e fazer um passeio ao Pico do Itacolomi. Foi quando vimos essa bola. À medida que chegávamos perto, ela diminuía, até desaparecer”, recorda-se.
 
E Leandro continua: “Tem também os casos das minas de ouro, sempre envoltas em mistérios, em que pessoas afirmaram sofrer chicotadas quando tentaram entrar em algumas. Esses corajosos acabaram hospitalizados, com marcas pelo corpo de origem desconhecida. E existe ainda o relato de um estranho batuque, no distrito de Bandeirantes, também em Mariana, que ficou conhecido quando um morador ligou para a Polícia Militar para reclamar do barulho que vinha do alto de um morro. Só que, ao chegar lá, a PM não viu nada, ouviu apenas o som. Hoje, a população, já acostumada aos ruídos dos tambores, chama o fato de Forró das Almas”, conta o pesquisador.

Tantos são os relatos que outro componente da Acam, Rogério das Dôres, passou a se interessar pelo assunto e começou a estudar ufologia, ciência que investiga fenômenos relacionados aos objetos voadores não identificados (Ovnis). Segundo Rogério, um terço da população é dimensional (de outros planetas) e os outros dois terços são planetários (da Terra). “Eu acredito que o homem e a mulher sejam descendentes de raças de ET”, diz.

PARECE, MAS NEM SEMPRE É
Como ter certeza de que certos fatos disseminados são algo realmente sobrenatural? Conforme diz Soares, existe uma metodologia para avaliar cada situação. “Analisamos, por exemplo, o número de aparições e os respectivos locais, além da incidência e das semelhanças dos testemunhos. Rastreamos também antecedentes do caso e estudamos a fundo o assunto”.
 
E se, como crava o dito popular, “as aparências enganam”, já houve, na história da associação, muitos aflitos que juraram ter problemas com o “lado de lá”, mas, na verdade, faziam parte de situações curiosas – e engraçadas. “Chegou à Acam um caso em que estalos e outros ruídos aparentemente inexplicáveis eram ouvidos, todas as noites, em uma fazenda. Contudo, esse barulho era provocado pela dilatação da madeira no período de verão. Outro relato curioso foi o dos espirros que se ouviam, todas as madrugadas, em uma propriedade. O professor Milton instalou câmeras no local e filmou nada mais do que um gambá resfriado. Isso sem contar a história da latinha de cerveja que rolava sozinha e fez com que um sitiante abandonasse sua fazenda. Apesar de muito estranho, tudo não passou de uma barata, que, ao entrar na lata e absorver o conteúdo, ficava zonza e, ao querer desesperadamente sair, movimentava o objeto”.
 
METODOLOGIA
Várias linhas de pesquisa são adotadas pela associação, de acordo com a afinidade de cada membro. Os integrantes são divididos em grupos segundo os temas de sua preferência. Formam-se, assim, núcleos da Acam: ufologia; assombrações; pesquisa histórica; metafísica; monstros e animais; busca, treinamento e enfrentamento; análise de novos casos; pesquisa de campo; desenvolvimento de equipamentos; segurança; suprimentos; recursos e contabilidade.
 
Os estudiosos se reúnem uma vez por mês, na sede da associação – que é secreta –, para debater as análises e planejar ações. “Evitamos divulgar o local a fim de não atrair pessoas que ainda não estão maduras para absorver os casos”, esclarece Leandro Soares. Há, porém, reuniões públicas para mostrar à população o que é a Acam e o que a associação faz, além de capacitar novos membros.
 
Atualmente, a Acam analisa 55 casos, alguns envolvendo todas as linhas de pesquisa, como é o do “olho-gordo”, em que se busca comprovar a ação da energia pessoal para alterar o equilíbrio biológico.
 
Outro estudo é sobre a ligação entre certas doenças e transformações genéticas, a exemplo do efeito da doença da raiva animal nos humanos e sua relação com o surgimento de lobisomens e vampiros.
 
Dentre todas as situações pesquisadas pela associação, têm prioridade aquelas que podem colocar a vida de pessoas em risco.
Para Soares, um dos pontos mais importantes é estimular todos os integrantes a manterem uma vida saudável para que nada interfira nas pesquisas. “É essencial termos equilíbrio psicológico. Por isso, aconselhamos nossos membros a não fumarem, a não beberem e a não usarem qualquer substância que altere seus sentidos”.
 
MEDO?
Os estudiosos têm ou não têm medo de encarar as assombrações? “Ter medo significa gostar de si mesmo. Aprendemos, todavia, a controlá-lo, até mesmo para conseguirmos usar um plano de fuga, como no caso do Caboclo D´água, que já fez muitos integrantes nossos correrem para abrigo. Na história de Capitão Jacques, fantasma de um minerador que assombra o interior das minas de ouro abandonadas, fica fácil ter medo quando se está a mais de 150 metros abaixo da superfície, na completa escuridão, e, de repente, as lanternas descarregam e as velas não ficam acesas por causa de algum vento. O jeito é manter a calma, pois nossa imaginação constante mente trabalha para nos confundir. Com as experiências das expedições de campo, vamos ficando mais calculistas, mas, que dá medo, dá”, confessa Soares.
 
Acostumado a ouvir diversas histórias de aparições na região de Mariana, o servidor público Leonardo Camello, de 32 anos, viu, na adolescência, a família passar por um fato dessa natureza. “Foi na residência do meu avô, que vivia num casarão de cerca de 300 anos, aqui, em Mariana. O quarto em que as empregadas domésticas dormiam fazia barulhos, as portas batiam, as janelas tinham ruídos diferentes, e vozes eram ouvidas. Com medo, a família recorreu, na época, à Igreja Católica, e um padre foi ao local fazer orações. Aparentemente, tudo voltou ao normal, mas o quarto foi fechado, e ninguém nunca mais ficou lá”, conta. Um tempo depois, lendo o jornal “O Espeto”, o servidor reviveu o passado e conheceu o trabalho da Acam. “Eu acredito nesses relatos e acho o trabalho da associação importantíssimo, pois há uma apuração séria, um estudo aprofundado. Eles ajudam a derrubar o véu de ignorância que ainda está diante de muitas pessoas”, ressalta Camello.
 
E o gosto dele pelo assunto hoje é tão grande que ele participou de um encontro de estudiosos do tema, realizado no dia 13 de junho, na Casa da Cultura de Mariana. “Acredito que nossa região está carregada por espíritos que participaram da construção destas cidades. Muitas deles receberam promessas quando trabalharam aqui e, por isso, se mantêm apegados. Isso sem contar os seres de outros planetas. Com os relatos passados no encontro, nós aprendemos mais e conhecemos novos casos”, conclui.
 
DISSECANDO A ASSOMBRAÇÃO
Os curiosos e interessados por assombrações e temas do gênero tiveram uma ótima oportunidade para conhecer o trabalho de pessoas e entidades que pesquisam o assunto. O Primeiro Encontro de Caçadores de Assombração e Estudiosos de Ufologia, realizado durante todo o dia, contou com 12 palestras e um debate no fim do dia, o lançamento do livro “Monstruário” e a exibição do documentário “Caçadores de Assombração”. Com 25 minutos de duração, o filme, feito pela produtora Esquina, de São Paulo, tem como protagonistas alguns integrantes da Acam e foi selecionado para exibição na Mostra de Cinema de Lisboa, de acordo com informação da edição 305 do jornal “O Espeto”.

 




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