Quando o leite não é o melhor alimento para o recém-nascido

Saúde e Vida

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Criado em 29 de Abril de 2015 Saúde e Vida

Fotos: Hilário José

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Se você, mamãe, está tentando amamentar seu filho, mas ele sente um incômodo muito grande, além de dores fortes, vômito e diarreia, pode ser que ele tenha alergia à proteína do leite de vaca, a APLV, que acomete atualmente 350 mil crianças em todo o Brasil

Lisley Alvarenga

“ELA MAMOU NO PEITO durante um mês e meio, mas, desde quando nasceu, chorava muito durante o dia e a noite. O incômodo após a amamentação era tanto que, muitas vezes, de tanto chorar de dor, ela perdia o fôlego e ficava roxa. Quando eu tomava iogurte, por exemplo, e amamentava, era pior; as dores ficavam ainda mais fortes. E, depois que passou a tomar o Nan, após meu leite ter secado, vomitava em seguida e tinha muita diarreia. Era uma situação desesperadora, pois não sabíamos o que ela tinha”. Antes de descobrir que a pequena Laura Lourdes Rezende, com 6 meses, sofre de alergia à proteína do leite de vaca (APLV), uma reação adversa que, geralmente, manifesta-se nos primeiros meses de vida, a empresária Stefânia Rezende Silva, 30, e seu marido, Tiago Felipe Silva Santos, 30, perderam muitas noites de sono junto com a filha.

Vivenciada hoje por 350 mil crianças em todo o Brasil, a alergia ao leite de vaca é uma resposta imunológica de defesa do intestino às proteínas do leite de vaca, que são reconhecidas como substâncias estranhas ao organismo. Por conta disso, este começa a produzir anticorpos, gerando uma inflamação e/ou alteração na função do intestino. Crianças com esse tipo de problema desenvolvem, desde cedo, sintomas gastrointestinais – vômitos, diarreia, cólica, sangramento e constipação intestinal –; respiratórios – chiado e dificuldade de respirar –; dermatológicos – urticária e dermatite –; e anafiláticos – baixos ganho de peso e crescimento.
 
Por causa dessa alergia ao leite de vaca, que provoca muito sofrimento e transtornos às famílias, estas precisam alterar radicalmente a dieta dos filhos. Delícias e guloseimas comuns no cardápio de todo brasileiro, como leite, queijo, iogurte, chocolate, manteiga, sorvete e biscoito, ficam terminantemente proibidas. “A alergia é um processo qualitativo. Portanto, independentemente da quantidade da substância ingerida, seja o próprio leite, seja seus derivados, podem ser desencadeadas as mesmas reações alérgicas”, afirma Magno Veras, gastropediatra e nutrólogo. Por isso, alguns sintomas devem servir como um alerta para os pais. Bebês que consomem o leite de vaca e, depois de 1 ou 3 meses de vida, começam a ter vômitos, diarreias e cólicas com muita intensidade podem ser alérgicos ao produto. “Sangue nas fezes do bebê também é um sintoma muito específico. Por isso, é importante que os pais levem a criança a um pediatra ou a um gastropediatra para avaliação”, completa o especialista.
 
Segundo o presidente da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia da Regional Minas Gerais (Asbai-MG), Roberto de Souza Lima, o quadro clínico aparece em alguns minutos e pode ocorrer nas primeiras 24 horas após a ingestão do leite de vaca. Suas manifestações clínicas vão se tornando mais intensas a cada dia. “Ao se suspender o leite por alguns dias, o quadro desaparece, retornando diante de uma nova introdução da substância”, detalha. Se, mesmo após o diagnóstico, o bebê continuar a ingerir o leite de vaca, o quadro clínico se tornará mais intenso, com diarreias fortes e vômitos. “Isso provocará desidratação severa da criança, que correrá risco de morrer. Além disso, ela poderá desencadear infecções respiratórias, como pneumonia, além de ter seu desenvolvimento físico comprometido. No caso das alergias de pele, o quadro de coceira se tornará bastante intenso, provocando lesões infectadas que poderão levar a uma infecção generalizada”, alerta o especialista.
 
Os motivos que levam uma criança a desenvolver a alergia alimentar ainda são um mistério para a ciência. Contudo, de acordo com Roberto Lima, existe um conjunto de fatores na gênese da alergia. Dentre eles, podem ser destacadas a predisposição genética, alterações na barreira intestinal, como infecções intestinais nos primeiros meses de vida, e exposição às proteínas do leite de vaca de modo precoce, o que, provavelmente, pode influenciar nesse diagnóstico. “Pai ou mãe que tiveram história de alergia ao leite na infância tem mais chance de ganhar um bebê com alergia à proteína láctea”, acrescenta.
 
Outra dúvida das mães envolve a amamentação. Apesar de muitas acreditarem que o leite materno pode causar alergia, isso é apenas um mito. “Porém, os bebês podem receber proteínas lácteas de origem animal quando as mães ingerem leite de vaca. Sendo assim, elas devem fazer uma dieta restrita e rigorosa do leite de vaca e de todos os seus derivados até o desmame”, frisa o presidente da Asbai-MG.
 
Foi o que aconteceu com a engenheira Isabella Santana Antunes Ferreira. Logo após descobrir que a filha, Gabriella Antunes Ferreira, na época com 2 meses, tinha alergia ao leite de vaca, ela teve que cortar de sua alimentação tudo cuja composição possuía leite. “Era necessário ler o rótulo de todos os produtos. Fiquei impressionada com a quantidade de alimentos que precisei restringir. Apesar de parecer simples, foi muito difícil. Tive que eliminar da minha alimentação queijos, bolos, biscoitos, vários tipos de pães, sobremesas, vitaminas, iogurtes e outras coisas que eu nem imaginava que tinham ao menos traços de leite, a exemplo de creme de cebola e biscoito de água e sal”. Mas, apesar do sacrifício, Isabella não mediu esforços para dar o melhor à filha, e, depois de alguns dias na nova dieta, Gabriella teve uma melhora impressionante.
 
CURA
Nem a criança alérgica nem a mãe que amamenta devem ter contato com a proteína do leite de vaca, que precisa ser substituído por fórmulas infantis à base de proteína da soja, fórmulas extensamente hidrolisadas (quando a proteína é “quebrada” de modo bem extenso) e fórmulas de aminoácidos (sem a proteína). Quanto mais cedo o problema for identificado, mais chances a criança terá de voltar a tolerar o alimento. “A cura existe, sim, mas o tratamento consiste em uma dieta rigorosa do leite de vaca e de seus derivados por um período mínimo de seis meses seguidos. Os testes alérgicos e as dosagens de IgEs (imunoglobulina E) específicas para a proteína do leite mostrarão o momento de iniciar a reintrodução da substância. Além de sua retirada da alimentação, cabe ao médico indicar o melhor substituto”, diz Roberto Lima.
No caso de Gabriella, a cura veio quando a menina completou 1 ano. Hoje, ela tem uma vida normal e come de tudo, além de adorar queijos e biscoitos e tomar leite normalmente. Mas, para que casos como o dela sejam recorrentes, é imprescindível, segundo a mãe, que os pais procurem ajuda médica assim que suspeitarem de qualquer sintoma, fazendo, a seguir, as devidas restrições alimentares. “Também é muito importante que aquelas mães que amamentam sigam em frente. Não é nada fácil ficar sem comer doces e outras delícias que o leite nos proporciona, mas é uma fase passageira, e os benefícios são enormes”, comemora.
Já a pequena Laura continua em processo de tratamento. Conta com a ajuda e os cuidados da irmã, Clara Francisca Rezende, com quase 3 anos, para enfrentar as restrições alimentares e buscar a cura definitiva. “Antes de a Clara comer qualquer coisa, me pergunta se aquele alimento tem ou não leite. E, quando ela toma ou come algo que tem leite, me pede para limpar seu rosto e suas mãos para poder brincar com a irmã”, emociona-se Stefânia, a mãe das meninas.
 

 




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