Uma história de amor pelo Movimento Apaeano

Criado em 17 de Junho de 2016 Conversa Refinada
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Ela assumiu a presidência da Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) de Betim há quase dois anos, mas já presta serviços à instituição faz mais de duas décadas. Assim que se formou em assistência social, Patrícia Gil, 40 anos, ingressou como professora na entidade, onde, naturalmente, sua vida profissional se desenvolveu, assim como também a pessoal, já que seus filhos, segundo revelou à reportagem, cresceram frequentando o ambiente da Apae. Enfim, sua história é dedicada à luta por uma melhor qualidade de vida para pessoas com deficiências mental múltipla. E essa dedicação ao próximo foi registrada pela reportagem, que, ao receber de Patrícia o retorno para a produção desta entrevista, foi informada por ela do falecimento de uma aluna da Apae, a Lulu, de apenas 6 anos, e pôde testemunhar a tristeza que tomou conta de seu coração naquele dia. Prova de que ela realmente estabeleceu uma relação de amor e afeto pela instituição e pelas pessoas que dela fazem parte. No ano em que a Apae Betim comemora o jubileu de prata, Patrícia tem este espaço à disposição para mostrar aos betinenses as ações realizadas pela entidade ao longo desse tempo.

 

Nome: Patrícia Gil

Idade: 40 anos

Família: dois filhos – Matheus, de 20 anos, e Filipe, de 15

Formação: assistência social

Profissão: presidente da Apae Betim

Naturalidade: Belo Horizonte

 

Há quanto tempo é presidente da Apae Betim? Qual a duração do mandato?

Assumi a presidência em janeiro de 2014 para cumprir um triênio. Ou seja, meu mandato se encerra no fim deste ano. Porém, posso ser reconduzida por mais um triênio. 

 

Como surgiu o convite para exercer essa função?
Foi naturalmente, no dia a dia da Apae. Era professora na instituição e, aos poucos, fui sendo incentivada pelos pais dos alunos e pelos colegas de trabalho. As coisas foram tomando forma, até que se consolidaram em 2013, quando se viu a necessidade de a entidade ter uma nova gestão. Então, organizamos um grupo disposto a enfrentar esse desafio e, graças ao apoio de todos, fomos eleitos, em novembro desse mesmo ano.

 

Você trabalhava em que antes de atuar na entidade?

Minha trajetória profissional está intimamente ligada à Apae, afinal, a instituição foi meu primeiro e único emprego. Iniciei aqui como professora, em 1995. Ao longo desses anos, recebendo o apoio de pessoas que foram fundamentais, como Sônia Melo, Martha Beatriz de Azevedo, Kathia Margareth, Ivani Almeida e Júnia Amaral, aprendi muito e cresci profissionalmente. São 21 anos de caminhada junto com a Apae: uma história de amor e dedicação ao movimento Apaeano na cidade.

 

A Apae está comemorando 25 anos em 2016.  Quais foram as ações mais relevantes que a instituição realizou ou as conquistas mais significativas que obteve nesse período?

A Apae de Betim nasceu como Associação de Pais e Amigos dos Deficientes (Apad), em 1991. Em agosto de 92, passou a se chamar Apae e a integrar o movimento Apaeno no Brasil. Como ocorre na maioria dos casos, esse projeto nasceu da necessidade de uma mãe, Kathia Margareth, que, ao ter um filho excepcional e se deparar com a falta de oferta de serviços básicos – que são direitos de todo cidadão – , como a educação, mobilizou muitos outros pais, os quais, juntos, fundaram uma associação. Ao longo desses 25 anos de movimento no município, a Apae conquistou, com a ajuda de muitas pessoas, três sedes próprias, inseriu no mercado de trabalho aproximadamente 30 jovens, minimizou os danos causados pelas deficiências através da estimulação precoce, incluiu várias crianças na rede de ensino comum e foi parceira em capacitações de profissionais na área de educação.

Na gestão atual, reformamos integralmente, com o auxílio de vários empresários da cidade, a sede da Apae, localizada no bairro Horto, e vamos iniciar, em julho, com recursos do Minas Cap, as obras de reforma da escola especial. Conseguimos também a doação de um micro-ônibus 0 KM adaptado, no valor de R$ 240 mil, através de emenda parlamentar do deputado federal Eduardo Barbosa (PSDB), e captamos, por meio da Lei de Incentivo ao Esporte e com o apoio integral da rede de supermercados Super Luna, o repasse de R$ 81 mil, que serão investidos em estrutura e equipamentos para a escola da Apae.

 

O que vocês estão planejando para comemorar os 25 anos da Apae?

Nossa festa junina, que acontece no dia 18 de junho, será a abertura das comemorações do jubileu de prata da Apae. Em julho, teremos o Jantar Solidário, no dia 1, e, na última sexta-feira do mês, faremos o Café com os Doadores, em que abriremos as portas da instituição para os doadores conhecerem nosso trabalho – essa é uma ação que realizamos anualmente, em agosto, mas, neste ano, antecipamos o evento em função das comemorações do aniversário de 25 anos. E, em agosto, que, além de ser o mês de aniversário da entidade, é quando se comemora a Semana Nacional da Pessoa com Deficiência, na última semana, vamos promover uma série de ações em Betim, mobilizando o poder público, os empresários e os cidadãos. Faremos uma exposição de fotos, inauguraremos a reforma da escola e retornaremos com a feijoada da Apae, evento tradicional que deixou de ser realizado por um período. Ainda não fechamos a programação, mas a ideia é promover ações até o fim do ano.

 

Quantos são os beneficiados pela Apae atualmente? E como é o perfil dessas pessoas?

Em nosso serviço especializado de 0 a 6 anos, realizamos cerca de 500 atendimentos mensais, nas áreas de terapia ocupacional, musicoterapia, fonoaudiologia, fisioterapia e assistência social. Na escola especial de ensino fundamental, temos matriculados cerca de 90 alunos a partir dos 6 anos. Também oferecemos oficinas socioeducativas para quem já está fora da faixa etária escolar. O perfil dos usuários é de crianças, jovens e adultos com deficiências intelectual e múltipla. Atendemos a qualquer pessoa que necessitar dos serviços oferecidos pela Apae, sem distinção de renda ou localidade. Mas damos prioridade aos moradores de Betim e às famílias mais carentes.


Qual a capacidade de atendimento da Apae? Existe demanda para ampliá-la? 

Estamos operando em nossa capacidade máxima, devido ao quadro reduzido de profissionais, o que é lamentável, pois nossa estrutura física nos permite atender três vezes mais, e temos uma grande demanda reprimida. Mas, infelizmente, não possuímos recursos financeiros no momento para ampliar o número de funcionários. Porém, mesmo assim, graças a uma parceria que firmamos com a PUC Betim e com a Faculdade Pitágoras, conseguimos ampliar os atendimentos em fisioterapia. 


Quantas pessoas com deficiências intelectual e múltipla há na cidade? Por que nem todas são atendidas pela instituição? O que precisaria ser feito para que todos possam ter acesso aos serviços prestados pela entidade?

As Apaes se defrontam com o desafio da ampliação de seus serviços, que são cada vez mais solicitados em um país de grandes desníveis sociais e de insuficientes políticas públicas e recursos financeiros. Há que se investirem recursos do município para que a Apae possa absorver toda a demanda existente. Sem esse investimento, várias pessoas ficarão realmente desassistidas, pois é muito difícil manter uma entidade desse porte exclusivamente com doações.

 

Quantas Apaes existem no Estado e no Brasil? Quantas pessoas são atendidas pela entidade em todo o país?

O Movimento Apaeano é uma grande rede, constituída por pais, amigos, pessoas com deficiência, voluntários, profissionais e instituições parceiras – públicas e privadas – para a promoção e a defesa dos direitos de cidadania e a inclusão social da pessoa com deficiência. São mais 2.000 Apaes distribuídas em todo o país, que propiciam atenção integral a cerca de 250 mil pessoas com deficiência. É o maior movimento social do Brasil e do mundo na sua área de atuação. O Estado de Minas Gerais possui 445 Apaes. Pelo sexto ano consecutivo, as Apaes do Brasil conquistaram o prêmio Marcas de Confiança, concedido pela revista “Seleções”. A marca Apae tem sido premiada todos os anos desde 2010. A premiação destaca as marcas consideradas sinônimos de confiança para os brasileiros na categoria especial ONGs.

 

De que efetivamente a entidade sobrevive?

A Apae sobrevive das doações recebidas através do telemarketing e dos sócios contribuintes, dos recursos obtidos com os eventos que promovemos ao longo do ano – bazar, palestra, jantar, festa junina – e das parcerias com as empresas da cidade e com o poder público. Além disso, o projeto Troco Solidário, que desenvolvemos em parceria com os supermercados Super Luna e ABC, e com a rede de lojas de calçados Moreira Calçados, também contribui para a manutenção dos serviços ofertados pela entidade, que ainda recebe doações feitas pelos cidadãos através de débito na conta da Copasa. Em julho, vamos lançar uma revista comemorativa dos 25 anos da Apae Betim, na qual iremos apresentar todos os nossos apoiadores.

 

 Vocês estão perto de realizar o Jantar Solidário, que ocorre anualmente. Como surgiu a ideia desse evento? 

A ideia do jantar surgiu 2014, quando procurei ajuda do Super Luna para desenvolvemos na cidade o projeto Troco Solidário. Ao saber da situação em que a Apae se encontrava, o proprietário da rede de supermercados, Navarro, prontamente se dispôs a nos ajudar e, assim, começou a mobilizar alguns empresários. O dono do restaurante Porteira Velha, Jairo, sugeriu que fizéssemos um jantar para conseguirmos fundos e destiná-los à Apae. Formamos, então, um time na primeira edição do evento – Navarro (Super Luna), Jairo e Rafael (Porteira Velha), Ricardo e Ivo (Eletro Betim), Fabrício (Cor & Art), Wenceslau (Hewa Engenharia) – com o desafio de vender 200 convites no valor de R$ 300 cada. Muitos acharam loucura, porém, felizmente, foi um sucesso de público e também de crítica. Hoje, o time cresceu e virou uma verdadeira seleção! Ampliamos os patrocinadores e os apoiadores, e construímos uma rede de solidariedade em favor da Apae. Com isso, o Jantar Solidário se tornou nosso evento-âncora, e já estamos em nossa terceira edição, que ocorrerá no dia 1 de julho. Há um mês do jantar, os convites estão praticamente esgotados.  Mas ainda há alguns disponíveis para venda na Apae. Cada convite custa R$ 200.

 

Existem metas a serem cumpridas na Apae, assim como normalmente ocorre em uma empresa? A Apae possui funcionários ou voluntários? Quantos são?

Sim, a Apae precisa apresentar resultados positivos. Para isso, são necessários planejamento e metas. As nossas metas são alcançar um atendimento de excelência, crescer e ampliar as ofertas de nossos serviços para minimizar as dificuldades enfrentadas pelas pessoas com deficiência e melhorar a qualidade de vida delas. Além disso, buscamos tornar a entidade sustentável. Para isso, estamos organizando a “casa” com o intuito de implementarmos novas diretrizes.

Para que todas essas ações ocorram, contamos com apoio de voluntários, que nos dão assessoria quando necessitamos. Temos 35 funcionários, e a maioria é mantida com recursos próprios da instituição. Por isso, são de extrema importância a contribuição e a participação da sociedade. Apesar de toda essa mobilização, enfrentamos dificuldades, pois as doações oscilam mensalmente, e nossa despesa operacional fixa é imensa. Mesmo cortando gastos e promovendo um choque de gestão, precisamos de muita ajuda, já que nossa receita é menor do que precisamos para mantermos de maneira ideal a instituição.

 

Como era a Patrícia antes e como é hoje, depois desse tempo à frente da Apae? Lidando com as dificuldades das pessoas atendidas pela instituição, certamente algo mudou em você. Conte para os leitores da Mais.

Nunca sabemos a força que temos até que nossa única opção seja sermos fortes. Sempre ouvia essa frase, porém não imaginava que eu viveria isso literalmente. O maior desafio que enfrentei até hoje foi lidar com a dificuldade financeira que a instituição atravessou por um período e conseguir resgatar a credibilidade da Apae em Betim – para fazer com que os direitos das pessoas com deficiência fossem respeitados –, adquirindo, com isso, apoio do poder público e de empresários. Isso me demandou muito domínio próprio, sabedoria, diplomacia, paciência, o que aprendi na marra. Encontrei forças onde não sabia que tinha. Sempre fui extremamente ansiosa e “ligada no 220”. Mas tive que aprender a lidar com minha ansiedade e a controlá-la. Hoje, percebo o quanto estou mais segura, centrada. Penso que esse tempo foi uma experiência fantástica em minha vida profissional. Eu me sinto mais preparada para os desafios que estão por vir. Aprendi a ouvir mais e a ponderar, e, sobretudo, a buscar ser uma pessoa melhor a cada dia. Mas o mais importante de tudo é que aprendi a admirar o ser humano pela potencialidade dele. Por isso, a Apae é a minha vida.

 

Como é o seu dia a dia?

Meu dia a dia é corrido. Estou, diariamente, na Apae e também me dedico, voluntariamente,  ao Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência, mais um meio pelo qual buscamos a garantia de direitos das pessoas deficientes. Levo uma vida bem simples: em casa, gosto de estar junto da família, adoro cozinhar e receber meus amigos, assistir a filmes e séries de TV, jogar uma partidinha de buraco. E, como sou fissurada em informação, gosto de assistir aos telejornais e, ao mesmo tempo, fico verificando as últimas notícias pela internet. Adoro estar por dentro do que acontece. Gosto ainda de me envolver em projetos que valorizem as pessoas. Sempre que pude, eu me dediquei a essas causas de forma voluntária. Acordo sempre muito cedo, inclusive aos sábados domingos e feriados, e sempre de bom humor. Atualmente, estou me dedicando a um novo projeto de vida, mais saudável, em que pratico uma boa alimentação e atividades esportivas diárias, a fim de ter uma melhor qualidade de vida e poder aguentar a rotina.

 

O que planeja para o futuro tanto em relação à Apae quanto à vida pessoal?

No que diz respeito à Apae Betim, vamos trabalhar para torná-la uma entidade sustentável, embora tenhamos um árduo caminho pela frente. Já meu planos pessoais são me especializar na elaboração de projetos e captação de recursos, criar uma assessoria, para que eu possa contribuir com minha experiência tanto no campo acadêmico como na prática, além de fomentar novos projetos nas instituições filantrópicas que necessitarem.

15) Qual é seu maior sonho?

Meu maior sonho é o de não ter que lutar contra as desigualdades, sobretudo as que as pessoas com deficiência enfrentam, e ver uma sociedade menos excludente, mais humanizada, onde as diferenças não inferiorizem ninguém.

16) Você gostaria de finalizar deixando alguma uma mensagem?

Sonho que se sonha só é só um sonho, mas sonho que se sonha juntos é realidade! Sou imensamente grata a todos os apoiadores que conquistamos ao longo desses dois anos e meio. Agradeço muito às pessoas que confiaram no meu trabalho. Sem ao menos me conhecerem, resolveram caminhar ao meu lado, pois acreditavam na força do movimento Apaeano. Preciso agradecer à equipe de profissionais da Apae, guerreira, que aceitou enfrentar comigo as adversidades e romper a crise e superar nossos limites. Sem o apoio dela, não teria conseguido. Encaramos com pujança os desafios postos e estamos “virando o jogo”. Que venham mais 25 anos!

 

SERVIÇO:

Sede administrativa: rua Santos Dumont, 159, Bairro Horto (atrás do poliesportivo)

Telefone: 3539.1155 (para informações e doações)

Facebook: Apae Betim




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